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Entrevista com a Associação LAMBDA

Entrevistamos o recém-nomeado Director Executivo da Associação LAMBDA em Moçambique, Roberto Paulo, para conhecer os esforços da Associação na promoção dos direitos das pessoas LGBTQ em Moçambique. A Suécia tem apoiado a LAMBDA desde 2010.

EdS: O que o motiva a defender os direitos das pessoas LGBTQ?

RP: O que move a LAMBDA a advogar pelos direitos da comunidade LGBTQ moçambicana de uma forma particular é a necessidade de assegurar a observância e respeito dos direitos humanos, pois os direitos humanos são universais e aplicáveis a todos os cidadãos independentemente de aspectos específicos que os diferenciam uns dos outros e no caso vertente, a comunidade LGBTQ em Moçambique tem os seus direitos humanos sistematicamente violados de diferentes formas tendo como base para esta violação a identidade e expressões de género bem como a orientação sexual.

Adicionalmente, a Lambda procura promover a visibilidade da comunidade LGBTQ que infelizmente vive escondida por medo da rejeição, do estigma e da discriminação, o que faz com que esta comunidade não possa contribuir de forma plena para o progresso do País, dado que muitas vezes o seu potencial é negligenciado ou ofuscado.

EdS: Na sua opinião, quais são os desafios enfrentados pela comunidade LGBTQ em Moçambique? O que pode ser feito para superar esses desafios?

RP: O acesso a educação: Infelizmente as escolas tendem a não ser locais seguros e inclusivos para com as pessoas LGBTQ por causa de situações de bullyng e discriminação perpetrada tanto pelos demais estudantes, bem co o por alguns professores e a consequência imediata tem sido os altos níveis de desistência da comunidade LGBTQ

O acesso a Saúde: O acesso a serviços de saúde por parte da comunidade LGBTQ tem sido um outro desafio devido ao facto de o próprio ambiente hospitalar muitas vezes não se mostrar bastante acolhedor para com as pessoas LGBTQ que geralmente são vistas de forma diferente das demais pessoas que frequentam as unidades sanitárias e por outras vezes o nível de preparação dos próprios profissionais de saúde tem sido motivo para maus tratos, o que desmotiva a procura destes serviços, nos últimos anos tem havido algum esforço das autoridades de saúde para o treinamento dos profissionais de saúde para que possam oferecer atendimento amigável, mas dava a vastidão do serviço o processo levará ainda algum tempo para que sejam formados todos os profissionais de saúde.

A aceitação social: A sociedade moçambicana tem enraizados valores heteronormativos, o que faz com que não se abra muito espaço para a aceitação das pessoas da comunidade LGBTQ por não se encaixarem nesta definição heteronormativa e como consequência deste aspecto, muitas das pessoas da comunidade LGBTQ não são facilmente aceites nas zonas onde vivem e inclusive há situações de pessoas expulsas do convívio familiar onde em principio deveria ser o local mais seguro para uma pessoa LGBTQ

O acesso ao emprego: Como consequência de um ambiente escolar não muito favorável para a comunidade LGBTQ a formação profissional acaba sendo baixa e como consequência o acesso ao mercado de emprego também se torna limitado aliado ao facto de a identidade e expressão de género constituir um motivo para não fácil aceitação e manutenção no mercado de emprego, o que faz com que alternativamente a comunidade LGBTQ tenha que se apoiar no auto-emprego e/ou emprego informal para a geração de sua renda.

O acesso a Justiça: Apesar de a Constituição da Republica de Moçambique no seu artigo 35 elencar que todos os cidadãos dão iguais e gozam dos mesmos direitos, este direito constitucional não se verifica na mesma proporção para a comunidade LGBT, pois os agentes da lei e ordem por exemplo tendem a ter atitudes discriminatórias p[ara com as pessoas LGBTQ, facto que muda quando são ministradas formações especificas para estes agentes. Adicionalmente, a associação LAMBDA que representa esta comunidade tem visto o seu processo de pedido de registo negligenciado (sem resposta a 12 anos), mesmo depois de ter cumprido todos os requisitos exigidos pela legislação moçambicana para a materialização deste direito constitucional (direito a livre associação). Esta falta de registo tem impactado negativamente na capacidade de a associação prover assistência de diferentes formas para a comunidade LGBTQ moçambicana.

O acesso a informação: O nível de conhecimento sobre assuntos ligados a Identidade e Expressão de Género e Orientação Sexual em Moçambique é limitado e a LAMBDA tem estado a desdobrar-se pelo País inteiro para garantir que haja informação correcta sobre a comunidade LGBTQ que promova visibilidade e desconstrua o preconceito a que esta comunidade está exposta, mas face a cada vez mais reduzida disponibilidade de apoios para iniciativas similares continua ser um grande desafio promover programas que contribuam para a construção de uma sociedade informada e com noção sobre a importância de valorização da diversidade e acima de tudo respeito pelos direitos humanos.

EdS:Quais foram as conquistas mais importantes do movimento LGBTQ / Lambda nos últimos anos?

RP: A Promoção da visibilidade da comunidade LGBTQ em Moçambique, pois com a expansão da Lambda para o nível nacional foi possível permitir que em todas as províncias do País, membros da comunidade LGBTQ pudessem ter espaços para interagir e auto apoiar-se.

A Participação da comunidade LGBTQ em diferentes plataformas de discussão sobre o desenvolvimento do País onde a sua voz é ouvida.

 A Descriminalização da Homossexualidade ocorrida no âmbito do processo de revisão do código penal em 2014.

A inclusão da população de Homens que fazem sexo com homens No Plano Estratégico Nacional de Prevenção e Combate ao HIV e SIDA e Directriz de atendimento a população chave do Ministério de Saúde como populações prioritárias que devem merecer atenção no acesso aos serviços de saúde

A aumento significativo de pessoas da comunidade LGBTQ que de forma livre pode livremente expressar a sua Identidade e expressão de género bem como a orientação sexual

O incremento substancial da disponibilidade de serviços e só nos últimos 3 anos (2018-2020) pouco mais de 20.000 pessoas da comunidade LGBTQ foram oferecidas testes para o HIV sendo que perto de 3.000 acederam ao tratamento antirretroviral e por outro lado mais de 850.000 preservativos e 840.000 lubrificantes a base de água foram disponibilizados, como resultado das intervenções realizadas pela LAMBDA.

 

EdS: Na sua opinião, a comunidade LGBTQ foi afectada pela pandemia Covid-19 de alguma forma?

RP: A pandemia do COVID-19 tem colocado a comunidade LGBTQ de forma particular em uma situação de acentuada vulnerabilidade tendo em conta o facto de grande parte da comunidade depender do trabalho informal (auto emprego e pequenos negócios) sector de actividades que foi drasticamente afectado pelas medidas impostas no âmbito da pandemia tornando a situação pior do que estava, pois sem estas actividades fica em risco a própria sobrevivência, o que acaba condicionado o acesso a outros serviços.

Última atualização 01 dez. 2020, 09.56